sábado, 5 de dezembro de 2009

O Show


No coração da cidade sofisticada subiu num ônibus kitsch junto com os jovens. O ônibus, linha normal de número 109, abarrotou-se e as luzes do placar colorido anunciando aforismos de um tal de Lewinsky iluminavam as tranças dos rastas. A cada parada, mais jovens, sobre os quais uma luz azul suave baixava e as cortinas cobriam o vidro fumé separando os passageiros da realidade lá fora. A multidão de jovens rebeldes esperava calmamente o fim da viagem com uma certa expectativa.

Junto com eles desceu quadras antes onde a polícia montara seu esquema de segurança fechando ruas com carros, sirenes coloridas e proibição de bebidas alcoólicas. Os rebeldes, todos iguais, que iam ver o Artista cantar sobre os males do mundo foram regimentados como prisioneiros em um campo de concentração. Assim, regimentados, separados, revisados e manuseados entraram no show anti-establishment.

O show começou como esperado e o Artista, um homem mais para a idade dele do que deles teve que se fazer gigante para abraçar um público de milhares, para poder fazer-se íntimo de todas essas pessoas e ter algum impacto, tarefa difícil numa situação normal, mas que aqui ocorreu sem maiores problemas já que maioria vinha com seus corações abertos, dispostos a serem entretidos, surpresos e preparados para obedecer qualquer comando que viesse deste homem ou qualquer outro que recebesse seu aval. No caso, um baixista que mais parecia um sargento e que urgia a multidão a pular a um ritmo punk e gritar "iô, iô, iô" de quando em quando. Sentia que era quase necessário tomar parte em certa adulação para poder apreciar o Artista, fingir que era ele seu maior ídolo, seu grande herói, para poder sair satisfeito esta noite.

Escutando as músicas, que conhecia e que o trouxeram àquele lugar, relembrou o cerco policial que se estendia por algumas dezenas de metros ao redor do estádio, e se perguntou se eram as autoridades que confundiam esta multidão com hooligans futebolistas ou então com reencarnados guerrilheiros dos anos 70 - ou seriam eles, os jovens rebeldes iguais, que não conheciam sua aterradora força latente e será que os que pulavam pensavam que referências ao 'boliviano' poderiam significar mais que a qualidade do pó?

No final da noite, o taxista era socialista.


Julia, 11/2009, Buenos Aires

A Convenção dos Taxistas

A Convenção dos Taxistas Reacionários


Imagine como seria uma convenção internacional de taxistas.

Se pudessem discutir seus assuntos

E ganhar prêmios, quando todos juntos?


Haveria o prêmio "Só Neste País"

Entre candidatos com prévia seleção,

Um tipo de Rap, uma competição.

(Mas não exatamente, que Rap é coisa de delinqüente!)


Ao som de alguma balada regional.

O MC? Um Convidado Especial

Da rádio local,

Algum "Ratinho" internacional.


O taxista inglês contra o português,

Jamaicano, cubano.

Nigeriano.

Da America Latina,

Brasil ou Argentina?


E o ganhador, o Taxista Rapeador?

Aquele que convencesse

O maior número deles

Que "Este País" não tinha igual.


E que taxista ganharia pro seu volante,

Dos prêmios, o mais importante,

"O Taxista do Ano"?


Aquele que de todos eles

Em quinze minutos de bandeirada

Juntasse, entre faróis e paradas,

Os mais reacionários chavões.


(Mas cuidado,

sem espantar o Cliente Convidado!)


Só ficaria de fora um taxista,

Errando pelas ruas, sem pares ou iguais.

Solitário,

Anti-reacionário,

O taxista-socialista.


Julia Buenos Aires 12/2009

terça-feira, 21 de abril de 2009

Corais

As células encontram um lugar para se firmarem.
Aqueles ossos velhos e abandonados
parecem adequados
célula em cima de célula em cima de osso
elas vão morrendo se calcificando.
Célula viva em cima de células mortas
O grande coral amarelo vai se reproduzindo.

Este não vai durar milhares de anos.
Mas vai se calcificando, endurecendo, amarelando
e arrebentando a carne vermelha grudada ao osso.
Sangrando.
E assim vai crescendo a fauna viva
Nas águas quentes de minha boca.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Good-bye London

A feeling of loneliness
Just me in a crowd.
No more going from north to south,
Inner city to inner city,
No more hops on the 73,
Different languages,
Different people.

Watching the bars,
Population change.
Today's Latinos,
Tomorrow's Eastern Europeans.
Girls, blonde and pretty,
Delighted customers.
Dark-skins in the kitchens.

In a daze, people come and go.
Some want the countryside,
Others their ‘home’,
To me, it's my town
The buses, the streets.
Trendy Hampstead, Camden Town,
Covent Garden, My Inner Cities.

So good-bye to Hackney
With its smelly Luanda bins
Busy and dirty Dalston
And to the Silverlink.
To Spanish squatters,
Kurdish militants,
West Indian yardies.

Good-bye to Highbury & Islington Station
With the homeless sitting by Barclays
And to beautiful Highbury Fields,
And to Clissold Park
(Unmanned toilets,
Needles in the playground).
Good-bye to London Fields.

Good-bye to Laycock kids
And friends of friends of Laycock kids,
Harassing the neighbourhood,
Shouting insults at middle-aged adults.
To the hostel opposite
And its fire engines,
To loud Kurdish music and to rap.

Good-bye to Brixton, Stockwell, Newham
And the Angolan community,
Asylum-seekers
And the NHS.
The NHS, my children’s birth, work.
Good-bye to the British Government,
To Tony Blair and the Welfare State.

Good-bye to the woman who took my mirror
Mirror of fake respectability.
Showing its veins, cracks, its fragility,
Like the kids shouting insults.
Respectability that crumbled away
Like the paint on the door.
Protecting us from them.

Good-bye to alternative London,
To unthinking London
To alienated London,
Good-bye to the long gone squats of Stoke Newington and Clissold Crescent
And to the long gone best carrot cake in town.
Not the Starbuck-Costa-Caffé Nero-carrot-passion-double-chocolate-cake in a pre-toasted ciabbata-style and iced-coffee-modern-imitation.
But to hippy, lovingly made, before-moving-to-the-West-Country Style!
(White, alienated, West Country).

Good-bye to Consumer Choice
(or may be not)
At least, to its more ideological,
Clinical version.
Goodbye to cynicism,
And emotionless condescending,
And to post-modern “everything is acceptable for a laugh" attitude.
Goodbye to the centre of the world,
And to the wastage of the pieces of my life.

Julia Felmanas

London 4/9/2003

Quando me descobri Mulher

Quando eu me descobri Mulher
Não foi quando eu era criança.
Quando eu era criança eu era humanista
Andava pelada, não entendia roupas
Não via diferença entre "maiô" e calcinha
Queria não ter dinheiro
E construir minha casa com minhas próprias mãos.

Quando me descobri Mulher
Não foi quando me tornei adolescente.
Quando eu era adolescente
Virei igualitária
Achava que podia o mesmo que os meninos
Se eles sim, eu também.

Quando me descobri Mulher
Não foi quando engravidei.
Quando engravidei
Me descobri bicho.
Descobri minhas funções
E disfunções físicas
Que me faziam menos que um animal
Descobri que não era herói
De uma novela com final feliz

Foi quando eu encontrei as latino americanas
Aí sim, me descobri Mulher.
Quando percebi a força que tinham
Aquela força que atravessava o machismo
A diligência, a capacidade de lutar até o fim.
Muitas lutas, mais de uma.
Primeiro com os homens, depois sem eles.

Foi quando descobri que elas eram minhas reais heroínas
As chilenas, as peruanas, exiladas, mexicanas,
As colombianas, equatorianas, imigrantes,
Brasileiras, trabalhadoras, provedoras.
Com elas aprendi o respeito e também a diferença.
Com elas aprendi a sentir orgulho de tudo que sou
Tudo e sobre tudo, Mulher.

Julia Felmanas

Florianópolis 03/2009

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Guerra Fria

A guerra foi fria, nos dizem,

Porque a ameaça foi feita:

De um lado, do outro.

Mas nada aconteceu.


Fria para os que não viram o sangue,

Fria pr'aqueles diante das TVs,

Que se viam, nada sentiam,

Quando viam.


Pedro Manuel ingressou no MPLA,

Depois de nascido o filho Vladimir.

Tinha dezoitos anos,

A guerra já ia a cinco...

Que conhecia ele?

De Luanda, não tinha sangue nas mãos,

Mas isso antes do Vladi...


Em Cuando-Cubango

Encontrou José,

Negro, Cubano,

Que veio ajudar seu país.

(Ou seria atrapalhar?)

Antes de chegar, que sabia d 'Angola?

Tinha até filha em Cabinda agora.


José voltou para Cuba,

Só pra conhecer a Nicarágua...

De Angola, não gostou,

De dia lutavam a seu lado,

A noite com os da Unita.

De lá voltou marcado,

Em seu corpo e sua alma.


A guerra foi fria, nos dizem,

Porque a Europa que tinha nas costas

Canhões, mísseis e foguetes

Não virou uma cratera nuclear.

...

No quarto do hospital psiquiátrico

Se prepara.

Volta à pensão dos refugiados.

Dizem que ali quis

Da janela se atirar.


Estela não se lembra, não acredita,

Não quer acreditar.

Ameaçou o pequeno Uílian.

Chamaram de post-natal blues.

Mas filho de estuprador,

É fácil carregar?


Sabe que a qualquer hora,

Podem mandá-la de volta.

Não é refugiada política,

É imigrante econômica.


Imigrante econômica...

Não conheceu o pai,

Imigrante econômica

Viu desaparecer a mãe...


Imigrante econômica

E alguém a ajudou,

A pegar um avião,

E aqui no frio,

De barriga, chegou.


Imigrante econômica estuprada...

Que resultou em barriga e no Uílian.

Imigrante econômica...

Será um insulto?


E a guerra foi fria, nos dizem,

Fria para os que não viram o sangue,

Fria pra'queles

Que diante de seus livros,

Se viam, nada sentiam,

Quando viam.

....

Monica olha pra filha,

Vê mudanças pela TV.

O Ditador chegou aqui,

E não é que o querem prender?


Deixou seu país às pressas,

Por ela e pelo ex-marido,

E agora que podia voltar...

Depois de tantos anos no exílio?


Voltar? Se não viu sua mãe morrer...

Família, como tinha,

Já não tem mais...

Sua filha,

Mais daqui do que de lá.

...E então?


Melhor é ir ver o General.

Gritar na cara dele,

Como nunca pôde gritar,

Chamá-lo de sacana, pular,

E pôr um pouquinho pra fora

De tudo, tudo aquilo

De que não pôde se olvidar.


E a guerra foi fria, nos dizem,

Fria para os que não viram o sangue

Fria pra'queles

Que, se viam, nada sentiam,

Quando viam.

...

E Janice?

Não tinha nada a ver com isso.

Só fez quatro anos de escola,

Não tinha uma por perto.

Os pais queriam sua ajuda,

Com os irmãos, em casa, na roça...

Achava que não estava certo,

Mas, se querer mudar era comunismo?.


E para nós, sufocados por ditaduras ou guerras,

Para nós, que não pudemos ter democracia,

Para nós, que a escolha política era exclusão, exílio ou morte?

Não tivemos opção na modernidade.

E agora?

Reclamam da Religião?

Dos Fundamentalistas?


Pois é... a guerra foi fria...

Fria para os que não viram o sangue,

Fria pra'queles,

Que se viram, nada sentiram,

Quando viram.


Julia 03/09

As Cortinas Rasgadas do Museu

As cortinas rasgadas do museu refletem uma história
Uma historia que se esqueceu
Que não se deixou viver
Parada no tempo,
Como se nunca houvesse existido
... e sem razão

As cortinas rasgadas do museu trazem uma dor
Uma dor, junto com os nomes das ruas,
De uma época em que se havia esperança,
Em que não se conhecia o futuro,
Só um passado terrível.

As cortinas rasgadas do museu
E os nomes das ruas...
...Das ruas, das casas e das pessoas...
Fingindo que nunca existiram,
Que nunca passou o que passou
...E sem razão.

As cortinas e as ruas estão lá,
Se escondendo, esperando que as pessoas não venham a se lembrar
Que se devia mudar...

Ou são as pessoas que se fingem de cegas?
Para querer guardar
Um passado que é ainda importante e cheio de orgulho
Mas que não se deve lembrar?

O momento é feito de outras coisas
De esquecer o passado, esquecer o orgulho...
... E de sorrir,
Sorrir e ver e aprender uma nova filosofia
A filosofia certa!
Quem não pode acreditar?

Quando todos dizem,
Todos pensam cheios de confiança:
A guerra acabou! O lado bom ganhou!
O resto...

Vamos, te dou minha mão.
E se seguir meu caminho,
Do jeito que EU te ensino,
Te salvarei.
Te salvarei e até prometo
Que posso esquecer as cortinas
As cortinas velhas e rasgadas do museu.

Julia Felmanas
Maputo 08/98

domingo, 5 de abril de 2009

Shopping Iguatemi

Um exército de moças entra no shopping. Poderiam ter sido feitas, todas elas, na mesma fábrica - a fábrica "Barverdadeira Brasileira S.A." Esperando a perfeição. Direto de ali para a exportação. É claro que de aqui a alguns anos, estas moças já teriam passado a data de validade. Seriam outras, mais bem acabadas, completas, mais 'cirurgicamente bem intervencionadas' - ecoando um elogio feito pela Veja a uma personalidade famosa - "agora com narizes perfeitos" ou "com 10% mais silicone nas bundas e seios". 10% a mais pelo mesmo preço, é claro. Só não pode é levar duas por uma, isso não! São todas boas moças de família.

O shopping, o mais novo da cidade, chegou tarde. Tão tarde que lotou imediatamente. A cidade estava ansiosa por mais alguns. Como pode, a cidade com a melhor qualidade de vida, só ter um shopping? E ainda um shopping já tão velho, pequeno. E elas saíram de suas tocas, escolas, casas de família, clínicas privadas e até das praias para encherem as praças e ruas artificiais do mais novo shopping da cidade, aquele que finalmente trazia as lojas paulistas. Assim as moças poderiam passear e ser celebridades aqui mesmo, na cidade, passear e fazer compras, sem ter que ir à São Paulo. E o shopping chegou. Já era tempo. Não importa se está em cima do mangue, que a região é alagadiça e que as casas ao redor possam inundar. Também não importa se as 17 novas salas de cinema passam os mesmos 5 filmes que passam nas outras 10 salas da cidade. Andar pelas ruas de porcelanato, ver suas reflexões nos vidros brilhantes das vitrines ou na figuras de outras moças, isso já dá satisfação demais.


Bonitas todas, sem gorduras a mais ou a menos, gorduras estas (ou será silicone?) sempre preenchendo os lugares certos. O cabelo sempre longo. Cabelo curto é só para as mais velhas - as que já passaram da data de validade - ou para alguma Atriz Global Rebelde, porque esta já pode. Os tamancos de salto alto, as calças tipo jeans apertadas e uma blusinha, engraçadinha, solta. Não são Femmes Fatales, nem muito sofisticadas, mas como naqueles filmes americanos, acessíveis, confortáveis e confiáveis - "the girl next door" - aquelas que inspiram as primeiras paixões, mas com quem se pode conversar e até casar, e sempre, sempre com um sorriso no rosto. Bonitas e simpáticas. Sim, produto para exportação.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Impressões de duas viagens: do Vale do Café ao Valle de los Ingenios

O Valle de los Ingenios se encontra nos arredores da velha cidade de Trinidad de Cuba que se enriqueceu através do cultivo da cana-de-açúcar. Em seu auge, a cidade e seus engenhos tinham uma população de mais de onze mil escravos em relação a uma população total de aproximadamente vinte e oito mil pessoas. Estas são terras devastadas. Os campos antigamente cobertos por florestas, e depois pela cana, agora secos, queimados, acabados. O sol de inverno, fraco, é constante e o céu azul clarinho sinaliza a falta de chuva. Hoje não tem cana, nem nada, mas o fogo comendo o mato ralo e um pouco de gado, leiteiro talvez, porque em Cuba não há muita carne de vaca. A fumaça sobe o céu já esbranquiçado, sem oxigênio, o fogo acalenta cada vez mais a terra já torrada e destrói as poucas possibilidades de qualquer outra vegetação vingar que não um campo pobre, propício a mais fogo. A floresta fora devastada por uma história sangrenta e, ambas, a floresta e a história, quase não deixam rastro. Somente algumas construções abandonadas, vilarejos pobres habitados por negros que por séculos permanecem ali ao redor das velhas plantações de cana-de-açúcar. Terras devastadas, história olvidada.


O museu do trenzinho é um restaurante, o museu, a antiga casa grande da fazenda, agora serve comida criolla - invariavelmente o arroz com feijão em sua versão cubana moros y cristianos, com carne de porco e viandas, isto é, batatas doces, abóboras, inhames, o que tiver. No quintal, um antigo trapiche (moenda) de ferro fabricado em Buffalo, EUA, em volta deste, duas negras esperam os turistas pedirem guarapo (caldo de cana). E só. No museu do rum é a mesma coisa. Os guias explicam: "tudo começou com a chegada da cana-de-açúcar...depois vieram as plantações e os escravos... Mas o que é realmente importante é que no século XIX a produção foi totalmente mecanizada... chegaram as máquinas e as estradas de ferro..." E assim, trezentos anos de história são mastigados e engolidos em um murmuro de segundos. Será vergonha da feia realidade que guarda aquela bebida mais bem refinada que nossa cachaça e que hoje é destilada por uma importante vinícola francesa? Uma história indigna que nem franceses, nem cubanos talvez queiram admitir.



E eu que pensava que a Revolução valorizaria esta história? Um pouco talvez. Em Havana tem a Casa de África em homenagem as relações pós-revolucionárias África–Cuba e também o Museu dos Orixás. A santeria hoje é reconhecida e está em crescimento. Paradoxalmente, a história da escravidão é melhor contada em Pinar del Rio, região mais conhecida por seus pequenos agricultores que pelas plantações escravistas, com uma reconstrução de um palenque – equivalente ao nosso quilombo - para onde os negros cimarrones escapavam da escravidão. Entretanto, no Valle de los Ingenios, as terras da cana, e nas ruas da velha Trinidad esta história parece escondida. Conta-se que José Martí queria a abolição da escravidão e que os negros estiveram ao lado da independência. Os negros, aparentemente, também foram os grandes beneficiados por La Revolución. Mas aqui no Valle a contra-revolução foi forte. Engenhos de açúcar, velhos senhores e conservadorismo normalmente andam de mãos dadas.


Se em Cuba a liberação do colonialismo e o abolicionismo caminharam juntos, as coisas foram um pouco diferente no Brasil. Em 1888 a Princesa Isabel decretou o fim da escravidão. Até hoje ela está viva em simbolismos culturais, embora a cantada princesa fosse a última governante de todo o continente americano, inteiramente marcado pela escravidão, a assinar a alforria geral.


No Brasil, o Vale do Paraíba valoriza a história do seu jeito. Ali se pode dormir em hotéis fazendas cheirando a madeira de lei encerada, comer com talheres de prata e, durante o festival de inverno, ouvir música clássica nos salões de magníficas propriedades em improvisados "saraus" ou então no centro da histórica Vassouras, capital do Vale do Café. Se pode ouvir histórias glorificando os barões do café, e visitar as lindas casas-grandes em estilo colonial com suas avenidas de palmeiras imperiais cubanas. Talvez, mais brasileiramente visível, (ou quem sabe também brasileiramente invisível), estão os turistas quase todos brancos (como disse Caetano Veloso), atuando em seus eternos papeis de senhores e os trabalhadores negros em seus simétricos e opostos papeis de vassalos. Se Cuba se envergonha ou esquece em vez de afirmar e valorizar, talvez acreditando que o socialismo é capaz de borrar o problema (e a história) racial, no Vale do Café ainda podemos respirar o ar da escravidão tão real quanto a grossa névoa matinal que quase logramos apalpar. Não há como evitar os contrastes múltiplos e constantes. A alguns minutos da industrializada Volta Redonda está Barra do Piraí, bagunçada e suja, meio esquecida, por onde a estrada de ferro ainda passa. Algumas fazendas históricas se encontram na periferia da cidade, isto é, nos bairros e não no campo. Mas as fazendas são o campo e em volta, mais afora, vilarejos, povoados e alguns quilombos de população toda negra (ou quase toda negra). Esquecida e pobre. É claro que certas fazendas tratam melhor a história do negro, valorizam-na um pouco mais. A fazenda Ponte Alta, por exemplo, mantém o prédio da senzala intacto e uma das empregadas negras participa do "Sarau" teatral que conta a história da fazenda e da região. Outras não se envergonham de glorificar o seu passado senhoril, contando as histórias dos homens que vieram se aventurar por estas bandas, que receberam títulos imperiais por causa da riqueza trazida pelo café plantado com mãos escravas.


O Vale do Café é como uma máquina do tempo que revela duas histórias desenvolvidas paralelamente pelo caminho de duas estradas de ferro. Uma que desce o Vale do Paraíba para o Rio de Janeiro, a outra partindo de Santos em direção ao interior paulista. Em seu ciclo de abatimento da mata nativa, plantação e exaustão da terra, e findo o escravagismo, as plantações de café foram se movendo ao longo do Vale finalmente atingindo o oeste do estado de São Paulo. À população negra, os donos deram o direito de ali continuarem ou às vezes deixaram-lhes lotes de terras agora inférteis e esgotados. . A estrada de ferro que inicialmente descera o café agora descia ex-escravos e seus filhos à capital, Rio de Janeiro, em busca de uma vida melhor. Assim os vilarejos, povoados, quilombos e "favelas" foram se formando. Do porto de Santos, que quase não viu crescimento entre os séculos da descoberta até o século XIX, subiram os imigrantes para a renovada atividade cafeeira no oeste, não como escravos, mas como pessoas livres. Trabalho duro, sem dúvida, dos quais muitos fugiam e se arrependiam, mas trabalho remunerado, colonos com outros direitos, outras concessões e em outras terras.


Esta não é uma história desconhecida e, no entanto, quantos brasileiros hoje são capazes de lembrar que o café foi em seu princípio uma cultura escravista? Para muitos esta lavoura é romanticamente associada à idéia do imigrante trabalhador, induzindo levianas comparações entre a suposta "incapacidade" do negro brasileiro com a "produtividade" dos imigrantes não-negros. Pelas marcas que ainda retem, o Vale do Café é iluminador, ali se pode compreender melhor os acontecimentos de mais de um século atrás. A história está tão imprimida na terra como as marcas das erosões que vêm arrebentando o Vale desde os tempos em que suas florestas fecundas foram cortadas para plantar os primeiros cafezais, onde o gado continua a machucar a terra e o café não cresce mais.


Igual que Cuba, a terra devastada, igual que Cuba, o gado, a secura, a névoa grossa da manhã invernal, a terra torrada, a falta de chuva, o céu azul esbranquiçado, a vaga lembrança de uma vegetação exuberante perdida para uma monocultura mal feita, devastadora, igual que Cuba o povo esquecido ao redor das fazendas que deixaram de existir. Cuba mais seca, sua floresta nativa dizimada, arrebentada e arrasada pelas conseqüências climáticas de hoje e de outrora, um país tropical sem frutas. Por outro lado, o sudeste brasileiro precisou que muitas mais florestas fossem cortadas para sentir a secura de um Rio de Janeiro que em julho se iguala em temperatura e teor de umidade à Lisboa. Posso estar sendo um pouco injusta com Cuba, mas se por um lado a herança da escravidão é palpável no Vale do Paraíba, isso não acontece conscientemente, mas pelo contrário, é porque é a conseqüência social de um modelo problemático que nunca foi solucionado e nem mesmo atenuado ou remediado.


Fora a gritante divisão do trabalho, dos opostos riqueza-pobreza, campo-cidade, branco-negro está o próprio festival de inverno do Vale do Café como símbolo maior desta herança. A programação cultural é clássica, européia; eruditas apresentações que condescendem em abrir espaço para o folclore local na noite do último domingo do festival. O que me atraiu ao vale foi ter aprendido sobre o jongo. Ver o jongo no Vale do Café era um dos propósitos de minha viagem. No domingo à noite, todos os grupos da região, inclusive grupos apresentando também folia dos reis e calangos tocavam em diferentes rodas ao mesmo tempo e competiam entre si pelo mesmo espaço no meio da praça. O palco armado para o festival havia sido desmontado, a maioria dos turistas já havia ido embora. Todos os grupos se apresentando juntos - e separadamente. Do jongo, conhecia a sua sutileza, seus cantos codificados, os desafios entre seus membros e o respeito aos mais velhos. Tudo isso perdido em meio a uma babilônia de apresentações, uma cacofonia de tambores e cores e cantos. Casualmente, encontrei uma das organizadoras do festival e perguntei. Porque? Será que não merecem um espaço para serem apreciados individualmente? Talvez não precisem de palco, o pé no chão convinha. Mas todos juntos? Ela simplesmente me respondeu "O jongo é só isso mesmo, não tem nada além disso". Na cidade branca construída pelas mãos dos negros, no Brasil moderno, ainda vemos o erudito para a educada elite e a brincadeira dos outros no final da festa. Quanto à organizadora, porque ela haveria de se importar? Hoje, no Vale do Paraíba, já não há viajantes estrangeiros que se mesmerizam com a “dança primitiva” dos negros.



Fazenda Ponte Alta, Vale do Café



Julia Felmanas 03/0

quinta-feira, 26 de março de 2009

Impressions: Brazil and Cuba From Vale do Café to Valle de los Ingenios




The Valle de los Ingenios is found in the proximities of the old town of Trinidad de Cuba, which became wealthy during the time of its sugar cane plantations. At the height of its development, the city and its sugar mills had over eleven thousand slaves with a total population of around twenty-eight thousand. Nowadays, these are devastated lands. The fields once covered in forest, and later in sugar cane, are now dry, burnt and exhausted. The winter sun is weak but constant and the light blue sky signals a lack of rain. Today there is no sugar cane, or anything else, just the fire licking up the grassland and some cattle - dairy perhaps - as in Cuba there isn't much beef. The smoke rises up to an already whitened sky, lacking in oxygen, the flames heat the charred land and destroy the small possibility there is of any other type of vegetation surviving, except for grass - more prone to catching fire again. The forest was devastated by a bloody history, and both - history and forest - leave almost no traces. A few abandoned buildings, poor villages inhabited by black people who for centuries have remained in this place, around the old sugar plantations. Devastated lands, forgotten history.

The museum you get to by train is a restaurant. The museum, an old plantation farm house, now serves Creole food - the ever present rice and beans in its Cuban version moros y cristianos, with pork and whatever root vegetables – viandas - are available. In the back yard, an old iron sugar cane grinder, made in Buffalo, USA. And there, two black women wait for the tourists to ask for a glass of guarapo. That’s it. At the rum museum, the scene is similar. The guides explain: “It all started with the arrival of sugar cane… then came the plantations and the slaves…But what really matters is that at the beginning of the 19thC production was mechanized, there were machines and the rail roads...” And in this way, around three hundred years of history were chewed up and swallowed in a matter of seconds. Could it be that the refined alcoholic drink, now distilled by the French, hides an ugly truth, too shameful to be acknowledged? A history that is, perhaps, too undignified for French and Cubans alike to want to remember?

I thought that perhaps the Revolution would value this history. Perhaps a little. In Havana there is the Casa de África commemorating post-revolutionary African-Cuban relations and also the Orishas Museum. Nowadays, santeria, Afro-Cuban religion, is recognised and growing. Paradoxically, however, the history of slavery is better told in Pinar del Río, which is best known for its smallholdings not slave plantations. There is a reconstruction of a Palenque - to where the negros cimarrones (runaway slaves) escaped. However, in the Valle de los Ingenios and in the streets of old Trinidad, this history seems hard to discern. It is said that José Martí wanted the abolition of slavery and that black people were on the side of independence. They were, apparently, the ones that most benefited from La Revolución. But here, in the Valle, counter-revolution was strong. Sugar plantations, old masters and conservatism usually go together.

Valle de los Ingenios


If in Cuba liberation from colonialism and abolition walked hand in hand, things were slightly different in Brazil. Princess Isabel abolished slavery in 1888 and even today she is kept alive in cultural symbolisms, despite the fact that the princess represented the last government in the whole of the Americas - entirely affected by slavery - to give slaves their freedom. In Brazil, in the Vale do Café, a region in Rio de Janeiro's Vale do Paraíba, history is told in its own way. You can sleep in farm houses turned into hotels smelling of waxed hardwood, dine using silver cutlery and, during the Winter Festival, hear classical music in the salons of these glorious properties in improvised saraus or soirées, or perhaps in the centre of the historic city of Vassouras - the old capital of this coffee region. You can hear stories glorifying the Coffee Barons, visit beautiful plantation houses in colonial style and their avenues of Cuban imperial palms. Here, the majority of tourists are white (or almost all white as Brazilian singer-song writer Caetano Veloso would once have said) playing the eternal part of the masters, and the workers black, in their symmetrical and opposite roles of servitude.

If Cuba is embarrassed or forgets to re-affirm and to value its history, perhaps believing that socialism is able to erase the problem (and the history) of race, in the Brazilian Coffee Valley we can still breath in slavery, as real as the thick morning mist covering the Vale do Paraíba in winter. One cannot avoid the many and constant contrasts. Not far from the industrialized, steel-producing Volta Redonda, is Barra do Piraí, messy and dirty, somewhat forgotten and still cut by railway lines – a rarity in Brazil. There are some historical farms in the suburbs of the city, not in the countryside, but still within the city limits. But the farms are the countryside, and further out, there are villages, small communities and quilombos – legally recognised communities originally made up of ex-slaves. A black population (or almost black), forgotten and poor. Of course, some of the old plantations take their black history a little more seriously. For example, the Fazenda Ponte Alta, has kept the senzala buildings (slave quarters) intact and one of its black workers takes part in the theatrical sarau which tells the history of the farm and the region. Others are less embarrassed about glorifying their master-slave past, telling the histories of the men who braved these lands and who received imperial titles because of the wealth brought by the coffee planted with slave hands.

Being in the Vale do Café is like being inside a time machine which reveals two parallel histories through two different rail roads. One that goes from the Vale do Paraíba down to Rio de Janeiro, the other leaves from the port of Santos towards the São Paulo state hinterlands. With the cycle of cutting down native forest, planting, land exhaustion, cutting down more virgin forest - and as slavery came to an end - coffee cultivation moved out of the Vale do Paraíba, eventually reaching the west of the State of São Paulo. The Vale’s black population was allowed to remain on the land, sometimes even receiving plots from their ex-masters. Land, which by now was infertile and exhausted. The railroad that once sent coffee to the ports of Rio de Janeiro, now took ex-slaves and their children to the old capital, in search of a better life. Thus villages, communities, quilombos and "favelas" were born. Around 500km away, immigrants left the port of Santos, which had not seen much development since the 16th C, to work on the regenerated coffee activity in the west of São Paulo, not as slaves, but as free men. It was, doubtless, very hard work, which many bemoaned, and from which many escaped, but it was paid work, for people with different rights and who were given different concessions and in different lands.

This is not an unknown history, and yet, how many people in Brazil remember that coffee was originally a slave-based culture? For many, this crop is romantically associated to the idea of the hard-working immigrant, which has sometimes led to absurd comparisons between the supposed "incapacity" of the Brazilian black population with the "productivity" of non-black immigrants. Because of the open scars it still carries, the Vale do Café is enlightening; it makes it possible for us to better understand the events of over a century ago. History cuts the land as deep as the erosion craters that have been destroying the Vale since the times when its fertile forests were cut down to plant the first coffee bushes, where the cattle still grazes the wounded land and coffee is no longer found.

Coffee Grinder, Fazenda Ponte Alta


Like Cuba, a devastated land, like Cuba, the cattle, the dryness, the thick winter morning fog, the charred land, the lack of rain, the whitened blue sky, a vague reminder of a lush vegetation that was lost to produce a devastating monoculture; like Cuba, the people forgotten around the now non-existent plantations. Cuba is drier, its forest decimated, broken, crippled by the climatic consequences past and present, a tropical country with no fruit. On the other hand, the south eastern region of Brazil needed many more forests to be cut before Rio de Janeiro in July could feel as dry as Lisbon. Perhaps I am being a little unfair to Cuba. However while the Vale do Paraíba's slave heritage is strong, this is not out of a conscious willingness to reaffirm history. It is because it is the social consequence of a type of development that has never been dealt with or even attenuated or placated.

Apart from the blatant work division, the opposites of wealth-poverty, city-rural, white-black, the Vale do Café's own Winter Festival stands as the utmost symbol of this heritage. The cultural programme is classical, European; erudite shows which condescend to give space to the local folklore on the last Sunday of the festival. What attracted me to the Vale was Jongo. To watch a Jongo presentation in the Vale do Café had been one of the reasons for my trip. On Sunday night, the community groups of the region, including those also presenting Folia dos Reis and Calongos were playing all at the same time and competing for the same space in the middle of the main square. The stage which was set up for the festival had now been pulled down, the majority of tourists had already gone home. All groups were "on stage" together - and separately. I knew about the subtleness of Jongo, its codified chants, challenges between players, the respect with which members held their eldest. All this was lost in a Babylon of presentations, a cacophony of drums and colours and sounds. By chance, I bumped into one of the Festival's organisers and I asked: Why? Did the groups not deserve to be enjoyed individually? Perhaps they did not need to be on stage, their performance was more suited to the ground. But why did they need to perform all together? She simply answered "This is all there is to Jongo, there is nothing else to see". In the white town constructed by black hands, in modern times in Brazil, we still can see the erudite for the educated elite and the fun for the others at the end of the party. But why should the organizer care? Today, in the Vale do Paraíba, there no longer are any foreign visitors to become mesmerized by the "primitive dancing" of the black population.

Senzala, Fazenda Ponte Alta, RJ, Brazil


Jongo in Vassouras
F




JuliaFelmanas 03/09
Earth's Affront to the Moon

Moon, you are a mere satellite
That happens to be quite bright
For this we are full of awe
Looking up from the floor.
As surely as you shine, reflect and illuminate
We foolishly seek to align ourselves with your fate,
Yet me and my big brother the sun
Can easily out-do you, with better pun.
Moon, you are just fine for a rhyme
But, I for one, will not be one to pine,
Please continue to hide your backside
As you interfere with our tides.

Phillip Wigan

The Moon replies...

Forget me then, I'll turn my back
And take with me the waves.
Enjoy your swims in the still, still sea
You'll miss your previous bathes.
No more dancing in the moonlight,
No more fly me to the moon
Who needs blue moons and moonshadows...
You'll forget them pretty soon.
I'll leave in peace, and take away
The moonlight, strong and tall.
Enjoy your walks in the dark, dark night,
Don't curse me when you fall.
The star will lose a little shine
The sea will not be seen
The world will be a darker place
You asked for it, not me!

Anna Cullum









domingo, 22 de março de 2009

The Revolution, the Wind, and Reggaeton


La Habana

In Cuba it was the usual story. Last year’s cyclone season had been marked by more frequent and intense winds, and now a prolonged winter chill - a cold totally out of keeping with the Caribbean even in the winter months - had settled on Havana’s night streets. Global Bloody Warming! Nowadays, are there any countries from where you do not hear anecdotal evidence about the climatic consequences of environmental degradation to Planet Earth? In Cuba you can’t help feeling that the locals have reason to be a bit sorer about this than most.

Cuba’s endemic economic poverty and its accompanying food shortages meant that last year’s cyclone-flattened fruit harvest hit the people hard. What little survived the brutal winds is earmarked for export, as the State desperately shores up any opportunities to earn foreign currency - so important to an island country unable to produce all essential products whilst operating within a globalised free trade environment with a US trade embargo tied around its neck. Cuban Economic Ministers have the world’s most askew balance-of-payments spread sheet.

But hey the Revolution – with a big proud capital R – is celebrating its fiftieth anniversary. Surely the Cubans are willing to sacrifice a bit of fruit for the cause, on top of all the other deprivations they have suffered since the 1959 upheaval. They probably are pretty well nourished in truth - despite the recent lack of fruit - and, despite the problems, when push comes to shove, many Cubans think things were far worse pre-1959, and are judicious on the subject of the global recession.

While the rest of the world argues over the economic effects of drastic falls in output, at least the Cuban Government can serenely cock a figurative leg to General Motors as the US car manufacturers’ output drops by half in 6 months, pointing to their educational achievements, their medical provision and expertise, and their sporting prowess as proof that the art of governance is not only about upholding consumer capitalism. In Cuba you cannot legally sell a car. Therefore having one, you tend to keep it forever. It is likely to be quite difficult to get one in the first place through various State - or other - channels. The result is that everyone keeps their car on the road; the concept of renewing, changing or upgrading is simply not part of the equation. But the winds still blow harder. While sales of electrical tape soar in Cuba to protect windows during cyclones, in America, GM’s sales plummet. It begs the question: In the final analysis, is it good or bad news about GM?

Meanwhile, the most common form of locomotion in Cuba is public transport, and it is on the buses that the sights and sounds of the Latin reggaeton music explosion are evident, even if its key motifs have little in common with this country’s brand of socialism and citizenship. Super-produced music videos (or films as they are coined) express a formulaic “Miami Vice” scenario, replete with manicured girls and slick boys in and out of love at fast parties, set against an expensive and gaudy materialistic backdrop – in fact everything the Cuban State demonises and rejects. But, and here is the crunch, the young and not so young Cubans cannot get enough of it, just as they salivate over the material grandeur of their favourite Brazilian soap operas. Fifty years of solid, if unspectacular, socialist indoctrination has seemingly failed to dim the human individuals’ attraction to glitter and gold. Are the hallmarks of the Revolution - solidarity, inclusiveness and equality - far less enduring than the passing fashions and glitz of Western style consumerism carried on malevolent and destructive winds.




Phillip Wigan 03/09